Esta exposição foi projetada para ser visualizada exclusivamente em um computador (alguns dos trabalhos expostos aqui não se adaptam a outros dispositivos móveis). Se você não estiver em um computador agora, esperamos que você possa, em outro momento, apreciar com calma e da forma mais confortável o ambiente que construímos.
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Utopias e Distopias Atmosféricas
Por Carolina Paz
Encontra-se na Wikipédia, a seguinte definição sobre o que é uma atmosfera: “uma camada de gases que envolve (geralmente) um corpo material com massa suficiente”.
Considere a atmosfera terrestre uma camada viva – assim como a pele é um órgão do corpo. O revestimento complexo, o cobertor gasoso está doente.
Pode-se afirmar então que o planeta está enfermo? Ou há alguma dúvida, qualquer uma, que contradiga o enunciado?
O desejo é de que haja. Porém, os indícios são outros e o ar que envolve, entra e sai de todos os seres terrestres é cada vez mais tóxico.
É rarefeito.
Doença de pele e falta de ar. Devastação e pulmões em chamas. Onde há fumaça há fogo?
Diante de uma paisagem tão desesperadora, alguns humanos tentam buscar salvar ou recuperar o ar puro. Talvez um ar-ideia ou um ar-utopia. Uma tal composição atmosférica de uma sociedade aditiva que integre de forma justa, empática e amorosa todas as diversidades não só humanas, mas planetárias. Quem sabe cósmicas?!
Para os debruçados na contemplação da realidade que espanca como punição ao descaso, viver a utopia é uma saída. A única condição possível de existir com alguma esperança.
Porém, há utopias e utopias!
De um lado, há o delírio de alguma forma de fuga ou de controle da situação. De outro, há a criação de alternativas de realidade onde o mundo é melhor como resultado de tomada radical de consciência. Exige esforço mudar aquilo que se observa sem filtros de distorção.
Privilegiados todos aqueles que podem enxergar o presente contexto, assim como ele é, com mais tempo de respiro, inclusive dando conta de suas infinitas versões interpretativas. Afortunados os que têm ferramentas criativas a sua disposição para empreender na invenção e aplicação de dispositivos transformadores da(s) realidade(s).
Entre vacinas, legislações e arquiteturas; entre receitas de pão, programas de computador e animais de companhia; há as obras de arte, objetuais e experienciais, das quais se pode lançar mão e promover a transformação. Micro e macro revoluções valiosas.
Pensada como uma grande experiência digital-poética-afetiva “Utopias e Distopias Atmosféricas” trata-se da primeira exposição do Clube da Uncool cujo objetivo primeiro é o fortalecimento de uma comunidade de práticas e pesquisas artísticas que visa a criação de realidades diversas de vida integralmente sustentável.
Neste espaço expositivo online, o espectador é convidado a se conectar com sensações, experiências de abundância de ar livre e respiração profunda, assim como sua ausência, inviabilidade, asfixia. As obras reunidas aqui traduzem essas atmosferas e são gatilhos para as vivências dessas “paisagens” sejam elas racionais ou emocionais.
Variadas oportunidades de interação com obras digitais e analógicas.
Convivência com outros visitantes e artistas.
As relações fazem parte desse projeto onde a compra de um trabalho de arte é muito mais do que a aquisição de um objeto. Ela é um gesto de vincular-se a um esforço coletivo de criação de uma outra realidade onde o mundo é mais saudável e os seres estão mais integrados e livres para viver bem.
Afinal, o que é sagrado? O eu, a casa, os filhos, as plantas, os bichos, as pedras, a água e o ar entre isso tudo.
Dezesseis artistas, a partir de seus diferentes contextos, em quarentena, em dezesseis pontos geográficos nas Américas do Sul e do Norte, nas cinco regiões do Brasil, ofertam delicados fragmentos de seus universos materiais e imaginários.
Dentro de uma das casas-céu de Val Schneider, numa brincadeira de montar e desmontar, pode-se observar as paisagens deslocadas por Ana Calzavara ou quase apagadas de Myriam Zini. O peso das pedras de Gustavo Moreno mergulha em rodopio no vórtex luas de Maria do Carmo. Girando, girando em círculos de acrílica de Suzana Barboza chega-se em outra dimensão onde todos estão de poros abertos e deixando-se atravessar.
Vazios e fumaças, de dentro e de fora, são soprados por Carolina Paz. O passivo convive com o ativo num jogo de ironia equilibrada. E assim, para dentro e para fora, é separado o fogo circunscrito de Fábio Tremonte, preservando a paisagem de Valéria Scornaienchi onde pedras são amuletos para metamorfoses minerais.
Socorro. Susurra o apelo semiológico de bicho-palavra de Andréa Tavares enquanto as mãos tocam organismos ribeirinhos fotografados por Lara Perl.
Ainda na rua, sentimos o cheiro do café-tinta de Darli Nuza que atravessa as janelas. Espia-se. Adentra-se. Na parede da casa em rosa-velho, há o retrato confinado de Maurício Igor em ponto de liberação e ouve-se com clareza o assovio do caboclo de Arthur Scovino numa reza à Nossa Senhora. Do quintal das narrativas maternas de Kika Goldstein e Liene Bosquê é entregue o convite e indica-se um horizonte. Olhe adiante! Que futuro vislumbra?
Fuga controlada ou acolhimento que cura? Qual será sua escolha?
Todos compartilham, sem saída, da mesma atmosfera. Todos a contaminam. Todos a compõem.
Curadoria:
Carolina Paz
Colaboração:
Darli Nuza
Publicação:
Laura Benevides, Camila Crivelenti e Ana Carolina Zequin
Produção:
Gabrielle Guido e Mariana Battistelli
Preparamos uma publicação especial para você baixar e interagir com o processo de criação deste projeto.
Entre manuscritos e partilhas: Clube da Uncool Artist
Por Darli Nuza
Ideias, desejo e disposição. Três fontes que se desdobraram em convites e reuniões com artistas e colaboradores. Pessoas que se dispuseram à partilha. Um grupo que se tornou um clube de colaboração: “colar o labor em prol de uma ação”. Com o intuito de angariar fundos que assegure a formação de artistas e promova a inserção destes no sistema de arte, nasce o Clube da Uncool. As mãos se unem. Iniciam os rabiscos das ideias e o lápis vai traçando possíveis conexões, palavras, processos e afetos. Logo, as mãos outrora ilhadas, se aproximam para assegurar o acesso de artistas a um acompanhamento e formação com excelência. E assim, a possiblidade destas novas vagas se abre, justamente, por ter pessoas que reconhecem a potência da partilha de seu trabalho e o poder dos desdobramentos destes anseios colocados em prática.
Com o propósito afinado, os encontros e reuniões do Clube tornaram-se lugar de processos e de ideias para produção. Além de ferramenta de registro, a escrita também é meio para o desdobramento poético de tantas ideias. Artistas, curadores e colaboradores não mediram esforços para criação e com uma temática em vista, desenvolveram seus projetos. Os vínculos nascem e as “ilhas” de produção autoral se tornam partilhas. Compartilhamos os processos de cada obra, a escrita, e aos poucos as “ilhas” se aproximaram, formando um arquipélago de poéticas.
Ideias revistas, troca de conversas, negociações e envios. Tempos pandêmicos, mas com a permanência de ferramentas e afetos de tempos normais, do cotidiano outrora vivido. Os manuscritos dão visibilidade ao processo e enriquecem afetivamente o objetivo final. O digital auxilia as reuniões online, enquanto os áudios conectam os sentidos. As cartas com suas especificidades, reúnem e aproximam esses gestos de afeto. Sim. Cartas. Em tempos de imersão na tela, escrever uma carta de próprio punho é um manifesto de dedicação ao outro. A escolha do papel, os dedos que deixam as digitais, o cheiro, os erros e assimetria de uma letra, o exercício da caminhada para o envio: afetos.
E assim, o anseio de formar pessoas entrelaça-se com a caminhada proposta para alcançar o objetivo. Logo, temos artistas que desejam, por meio de sua poética, suster a formação de tantos outros, e ao mesmo tempo, fazer desta produção uma caminhada sensível. O manuscrito nos traz a memória essa sensibilidade que nos move para essas partilhas. Sentar, pausar, pensar o que escrever, dobrar o papel, expor a letra, anotar a data, registrar um nome junto ao seu. Propor um vínculo, se dispor a perguntar sobre o outro, usufruir da beleza do ordinário em forma de papel e letra. Assinar, deixar um afeto, o abraço.
Quem adquire uma obra desta iniciativa/projeto está se juntando a este arquipélago de arte e afetividade. Com uma poética em mãos, afetuosamente acompanhada de uma carta de próprio punho do criador, o colaborador/colecionador abre vagas para formação de artistas compondo, junto ao Clube, partilhas. Portanto, participar deste projeto é envolver-se ativamente em mudanças de si e do outro. É ser “ilha” e por meio da partilha, agigantar esse arquipélago de ações por um sistema de arte acessível e inclusivo.
Sinalização de interatividade e informações das obras exibidas nesta exposição:
Val Schneider
.aqui dentro aqui fora. 2020
Vinte e três caixinhas de madeira, gesso acrílico, grafite, verniz, tinta a óleo e acrílica. Medidas de referência: 68 x 59,5 x 5,5cm e/ou 50 x 32 x 34 cm.
Respiro sozinha. Perceber a fragilidade desta condição nunca foi tão evidente como na pandemia. Pensar na impossibilidade de respirar sozinha, mais ainda.
Me lembrei de ouvir rádio com meu pai, deitada no ombro dele. O pai massageava meu estômago, a mão dele era seca e fazia um barulho áspero, era bom. Os sons e o movimento da mão às vezes se encaixavam no ritmo da nossa respiração tranquila, enquanto eu via pela janela a paisagem sumir no escuro.
Pensei nessa sensação para este trabalho. Pedi a pessoas muito queridas para contar alguma lembrança e, de alguma forma, relacionar com o isolamento ou algo de agora, a elas a minha imensa gratidão.
Ouvi suas vozes, suas texturas, seus ritmos e nuances enquanto produzia.
Penso na memória como um jogo de montar, que se atualiza, que escapa, cheio de compartimentos, lugares imprecisos, sem bordas, sem prumo. Como algo passado ela não serve, mas talvez sirva como uma espécie de recurso do instante, para apoiar um desejo que se manifesta ou quando um querer é interpelado por forças que podem impedir o existir, o respirar. Uma lembrança não é inteira, nem é bem uma imagem, nem é bem uma verdade, talvez seja como a atmosfera, que parece ser azul por conta da distância. Lembrar, inspirar e expirar, aqui dentro e aqui fora do meu corpo, ainda são condições intransferíveis e essencialmente frágeis.
No trabalho proponho uma espécie de jogo ou maquete que pode ser montado de diversas formas e é composto de caixinhas em diversos formatos. Algumas caixinhas cabem nos ouvidos e se ouve um som atmosférico, como nas conchas se ouve o mar. Algumas, quando encaixadas na boca, fazem a voz soar macia e profunda, e pode-se ouvir o retorno da própria respiração. Dentro delas pintei de azul e branco, sugerindo nuvens e, por fora, com grafite, fiz desenhos que remetem a paisagens. Mover lentamente para encaixar os desenhos, empilhar ou alinhar as caixinhas juntas ou em conjuntos pode ser uma brincadeira para relaxar e prestar atenção na respiração.
As vozes são de Gabriele Menegati Girardelo, Marvin Rojeski, Coco Capitânio, Joice Beatriz da Costa, Elisa Iop, Dunia Scnheider. Muito obrigada pelo carinho.
Ana Calzavara
Amanhã, vai ser outro dia? 2020
Díptico de xilogravuras impressas em cores sobre papel Kozo 40 x 40 cm (cada).
O díptico de xilogravuras (bem como o vídeo de mesmo nome) lida com a imagem do binômio potência/falência. Ambos foram elaborados especificamente para o Clube da Uncool, na ocasião da exposição “Utopias e Distopias Atmosféricas”.
As gravuras apresentam um recorte da exuberante paisagem da Mata Atlântica em meio ao crepúsculo, onde a luminosidade, pouco a pouco, desaparece. No video, esse movimento da luz acontece juntamente com o despertar dos sons e ruídos noturnos. Marca-se uma oposição, onde à medida em que se intensifica a sonoridade da floresta, percebe-se o esgarçamento da definição da imagem através da silenciosa dissipação da luz.
Potência e falência; utopia e distopia. Tempos de hoje. À noite que adentra sucederá a manhã ou o amanhã será uma noite permanente?
Myriam Zini
neblina #1, 2, 3. 2020
Tríptico. Acrílica sobre linho, 20 x 20cm cada.
Este tríptico da serie “Neblina” produzida para o projeto Clube da Uncool Artist tem como ponto de partida a vista de minha janela, um horizonte no rio de la Plata em Montevideo, Uruguai. Esta vista, que no cotidiano é mais ou menos nítida, ensolarada, nublada, … começa a borrarse na presença da neblina, de forma mais ou menos intensa até confundir-se no horizonte a água, o céu, deixar ver somente as silhuetas das árvores no primeiro e no segundo plano por transparencia e as vezes ficar tudo branqueado. Tudo por conta da natureza. Não tem força humana capaz de intervir nestes fenômenos. Uma metáfora possível da pandemia do 2020. Ao mesmo tempo respiro da natureza, manifestação da força da natureza e fraqueza do humano, e também esta neblina ao redor do assunto mesmo, do que fazer, das informações e contra-informações. Nada claro. Nenhuma certeza. Muita indefinição. Por isso, as três obras do tríptico podem ser colocadas na ordem que quisermos.
Gustavo Moreno
Era um silêncio como se fosse acontecer alguma coisa que um homem não percebe, 2020
cimento, água e pigmento sobre papel Hahnemühle. 65x76x1,5cm.
Os escorrimentos que surgem dos materiais despejados, são conduzidos pela água, vão encontrando seus caminhos, criando fissuras, volumes, em camadas e camadas de texturas.
Eu tenho me interessado pelos imprevistos, os erros e as surpresas que vão acontecendo durante o processo. Não tenho controle sobre o resultado, mas de uma certa forma acabo domesticando essas ações em busca de repertórios de paisagens, como rochas, arbustos, terra, nuvens e etc.
Me interessa pensar em um lugar silencioso, numa paisagem sem ruído.
Maria do Carmo Verdi
Vórtex 4, 2020
Guache sobre papel Hahnemühle. 90 pinturas, 10,4 x 14,8 cm cada e 2 vídeos de animação distribuído em 4 estojos de alumínio.
2020… fomos tomados pelo Vórtex.
Vórtex 4 é um trabalho que desenvolvi especialmente para a exposição Utopias e Distopias Atmosféricas, uma iniciativa do Clube da Uncool.
A obra trata dos primeiros 6 meses de isolamento.
Uma série de 90 pinturas pequeno formato que representam a ciclicidade do tempo vivido, entre os dias 13 de março e 31 de agosto em meio a pandemia.
Programação visual dos estojos: Vitor Sugimoto
Suzana Barboza
Aproximação, afastamento. 2020
Políptico acrílica sobre tela, 6 telas de 18x24x1,6cm.
Entender o maior através do menor. Perceber que está do lado de fora através do que temos no lado de dentro. É assim, investigando a sutileza do micro que explicamos o assombro que se encontra no macro. Foi assim que este trabalho veio ao mundo. A qual mundo? Difícil dizer.
Carolina Paz
Contain/Contained, 2020
Oil on paper, 26 x 19 inches each.
Este trabalho foi desenvolvido especialmente para o Clube da Uncool em ocasião da exposição “Utopias e Distopias Atmosféricas”. Trata-se de uma videoinstalação em ambiente digital onde o visitante pode interagir com imagem e som controlando seus tempos, gerando ecos e pausas. A partir da ideia de contenção e liberação de fumaças, névoas e nuvens, articulei dois espaços, dentro e fora, utilizando formas retangulares e a relação de positivo/negativo. Para colaborar com o levantamento de verba que possibilite a inclusão de bolsistas na formação ILAP do próximo ano, desenvolvi duas pinturas a óleo sobre papel. Criei dois cinzas quentes, um claro e um escuro e articulei a mesma composição de retângulos e a relação positivo/negativo que fiz para a instalação. As palavras “Contain” e “Contained” foram desenhadas em letra cursiva da forma como treinei na escola, nos cadernos de caligrafia. Há também um esfumaçado produzido pelas pinceladas.
Valéria Scornaienchi
Devaneios sobre a pedra, 2020
Impressão fineart sobre papel algodão, escrita sobre papel pólen, sarrafos de madeira, 02 pregos 30x39x2cm (impressão) 20×12,5cm (manuscrito).
Esse trabalho é uma experiência de ser pedra. Olhar o mundo através do olhar da pedra. Sentir o que a pedra sente. Não seremos todos pedras? As imagens foram feitas no ateliê com essa pedra, moradora antiga da casa. Tentativa de devolver a ela a sua essência compreendendo que temos todos a mesma essência. Instruções de montagem: O trabalho deverá ser montado como se monta um altar. Escolhe-se um lugar, e com a delicadeza que merecem todas as coisas, faz-se a instalação. O vídeo pode ser projetado ou visto em qualquer equipamento. Eu sugiro que a partir do momento que se adquira esse trabalho você possa olhar para todas as pedras do mundo como sagradas, assim como eu.
Andréa Tavares
Afasia, 2020
Nanquin, papel carbono e lápis sobre papel fabrianno itália. 70 x 50cm cada.
O desenho trama uma linguagem aberta, sujeita a ambiguidades e erros. Por um momento escapa ao desenhista, escapa ao observador. Um parêntesis a ser preenchido. Afasia para a filosofia é o um lugar ou momento de abstenção consciente de qualquer juízo de valor. Essa suspensão do julgamento acontece porque se reconhece a ignorância do ser sobre tudo que transcende as suas próprias possibilidades cognitivas. Originaria do grego afasia quer dizer incapacidade de falar, assim os neurologistas investigam os momentos de falha, onde o sujeito perde parcial ou totalmente a capacidade de captar, manipular a linguagem.
O trabalho Afasia (2020), um tríptico, é um ensaio visual que lida com a imagem de um urso empalhado originário da América do Norte, fotografado por mim no Museu de História Natural de Londres. Um ser sacrificado à ciência, exposto num destes grandes arquivos do mundo branco, congelado em uma posição de quem vai atacar. Seu movimento, selvagem e agressivo, congelado momentos antes do golpe de misericórdia. Três aproximações, três desenhos, que tateiam a linguagem dos arquivos e das classificações que procuram explicar, dar sentido ao mundo. E o sentido derrama e escapa, num jogo que transcende nossas habilidades cognitivas. Ainda assim entramos no jogo.
Lara Perl
como respiram os bichos, 2020
Publicação única. 15 impressões fine art em papel japonês 25cm x 24,5cm.
durante o isolamento, no mato, as montanhas sussurram imagens de ar. observo os movimentos das luas e os buracos nos corpos dos bichos que tiveram que adaptar a respiração diluída em água para ocupar outros espaços da terra. todas as criaturas vieram da água. um pulmão totalmente seco sufocaria. penso em leões e acrobacias e icebergs e, de repente, escorpiões gigantes no fundo do mar; as primeiras criaturas. tento respirar. vulcões entram em erupção e quero apenas viver um dia de cada vez; cozinhar, ler algo sem importância, ouvir os sons ao redor, sentir o tímpano, único buraco que ficou. um coração se move lentamente entre as árvores e, com ele, um poema; talvez o haikai. pequeno som, discreto, quase rarefeito, que só existe na porosidade da página e nas margens de uma imagem.
Piatã, Chapada Diamantina, 2020.
Imagens e captação de sons – Lara Perl
Edição e mixagem de áudio – Tomaz Loureiro
Darli Nuza
Silêncio no zói do zoto é refresco, 2020
Aquarela café sobre papel aquarela 300, 30 cm X 42 cm.
te olhas
uns já nascem sabendo o lugar que tem
apontam, mostram
outros ficam em um meio
num limbo
nem de lá, nem de cá
são aceitos
aceitos ou tolerados?
podes esperar,
em algum momento vais perceber:
ser tolerado é também ser preterido
é a pele suja,
ainda que esteja limpa
jamais vais ser como um deles,
ainda que tentes
simplesmente não é
vê bem,
de forma cautelosa
te olhas e percebes
não somos um, somos vários
Mauricio Igor
Que estruturas impedem o olhar para si? 2020
Fotografia sobre papel pardo, paspatur de 10cm e moldura com vidro. 35 x 41 cm.
Alicerçado em processos históricos e políticos, foi criada na cultura ocidental uma forma de pensar que privilegia determinados grupos e culturas em detrimento de outros. Assim sendo, a partir de hierarquias, são colocados modelos na forma de ser e produzir. Exalta-se de um lado, subalterniza-se quem nele não se encaixa. É assim que de maneira estrutural são atravessados na história padrões estabelecidos que aprisionam algumas existências. Trancam-nas, e por vezes as impedem de olhar para si mesmas e se reconhecerem.
Aqui, o papel pardo é usado para trazer a complexidade que envolve o termo “pardo”, enquanto moldura e paspatur adquirem não apenas um sentido estético, mas aparecem como representação de tais estruturas que cerceiam algumas existências.
Trilha: Victoria Santa Cruz
Arthur Scovino
Lágrimas de Nossa Senhora, 2020
Instalação/objeto/performance. Caixa-gaveta de madeira 39x16x21cm, rosário, pintura em papel canson, fita k7, Álbum de fotos 10x15cm, pendrive com dois vídeos.
“Na parede da casa em rosa-velho, há o retrato confinado de Maurício Igor em ponto de liberação e ouve-se com clareza o assovio do caboclo Arthur Scovino numa reza à Nossa Senhora.”
Carolina Paz
Kika Goldstein
Fragmentos de memórias, 2020
Díptico. Óleo e cera de abelha em tela sobre madeira 20cm x 15cm / 20cm x 20cm.
Colagem sobre papel fabriano 18cm x 24,5cm.
Em meu trabalho tenho explorado a pintura como paisagem e lugares imaginários. As ideias surgem a partir de memórias afetivas, como fragmentos da minha essência enquanto forma e cor.
Esse tempo de reclusão me trouxe muitas questões existenciais. Sobre a intensidade entre as necessidades que criamos verso o tempo que investimos para conquistarmos todas elas. Qual é o preço de tudo isso? Quanto tempo deixamos de estar com nossa família ou pessoas que acreditamos ser importantes para nós?
Tenho duas filhas e nessa quarentena estou vivendo a maternidade de forma muito intensa. Essa experiência maravilhosa me traz sentimentos paradoxos. De um lado esse amor incontrolável, visceral que dói de tão grande e por outro vem a frustração de querer pintar, pesquisar, ler ou qualquer atividade relacionada ao fazer artístico que é afetada pela necessidade primária de ser Mãe. Porém, ser mãe não substitui a minha vontade de criar coisas e colocá-las no mundo e nesse processo encontrei uma saída pedindo ajuda para a Nina, minha primogênita de 5 anos, ela pintou com pastel oleoso pequenos pedaços de papéis coloridos e a partir deles eu fiz pequenas colagens que serviram de inspiração para algumas pinturas desse período.
A pintura Fragmentos de memórias surgiu desse processo caótico e lúdico entre a utopia de criar uma nova realidade e a distopia de viver a própria tal qual estamos vivendo. Ela representa essa atmosfera paradoxal da delícia de ser mãe artista e poder compartilhar essa criação com uma de minhas filhas, mas do entorno opressor de muitas incertezas da nossa existência atual.
Nesse contexto, o trabalho emerge entre territórios de cor que convidam o público a pensar a partir de uma perspectiva ampliada, levando aos detalhes mais sutis. A intenção é criar uma relação entre as imagens que partem do meu imaginário e como essa construção reflete em quem as observa.
Imagem da capa: Bliss é uma imagem para Windows desenvolvida por Stephane Couture & Marc-Antoine Tanguay. A imagem foi incluída nos temas do Microsoft Windows XP.
Fonte: Wikipédia
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