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Quem está invisível na manutenção dos nossos cotidianos?

Conheci o trabalho de Daniela Ortiz em um curso de fotografia latino-americana e venho desde então acompanhando seu olhar sempre muito lúcido e crítico sobre questões vinculadas à classes sociais, gênero e imigração.

97 empleadas domésticas (2010) é um dos trabalhos sobre os quais eu sempre quis falar, tão conectado à realidade brasileira ainda que os registros sejam de famílias peruanas (o Brasil é o país com a maior população de domésticas do mundo, uma marca da absurda desigualdade social).

A priori os registros (retirados do Facebook entre 2008 e 2009) são de famílias de classe alta em momentos cotidianos de aparente ausência de conflitos, mas uma imagem é parte constitutiva de uma trama social, política… e aqui ela denuncia a invisibilização das responsáveis pelas atividades de manutenção que sustentam nossos cotidianos (em sua maioria, mulheres).

Interior da publicação
Interior da publicação

Lembrei do Manifesto pela Arte de Manutenção, 1969! de Mierle Laderman Ukeles, quando a artista eleva atividades de manutenção ao status de arte e entrevista diferentes classes sociais e tipos de ocupação incluindo “o cara da manutenção”, “o cara do correio”, “a empregada”… A proposta das duas artistas não é a mesma, mas se encontram quando colocam o foco em quem/o que está ofuscado pelas relações de poder que estruturam a nossa sociedade.

Voltando às fotografias reunidas por Ortiz, as imagens questionam: o que escapa à autorrepresentação desses grupos sociais? Esses registros aparentemente inocentes e apolíticos evidenciam, em verdade, a subalternização dessas mulheres, ausentes apesar das suas presenças, aprisionadas à essa condição “como se fossem da família”.

A experiência do isolamento visibilizou ainda mais a importância dos cuidados e a dimensão política do espaço doméstico, mas também nos afirma como a nossa dinâmica histórica, social, geográfica mudou pouco. Voltemo-nos aos arquivos, quem pode aparecer nos registros? Quem está fora de foco? quem escapa do enquadramento? Por quê? Em quem se apoiam as estruturas?

Imagem destacada: Publicação (foto: àngels barcelona)

1 thought on “Quem está invisível na manutenção dos nossos cotidianos?”

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